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sábado, 28 de maio de 2011

Rossana Roberta Pinheiro: Um trabalho ético e mais justo em prol das minorias potiguares

MULHER - Potiguar Notícias

Matéria: Andressa Vieira

Minhas impressões sobre a delegada Rossana foram confirmadas e as minhas expectativas – sempre se idealiza alguma –, excedidas, quando a encontrei, pontualmente às 9h, no local marcado para a entrevista. Delegada, sim, embora tenha deixado a atividade direta há quase oito anos, mas ela justifica: Uma vez delegada, continua-se delegada. Talvez por o cargo ser obtido através de concurso público. Mas a razão que eu atribuo é o fato de que a essência do seu trabalho como delegada, Dr.ª Rossana Roberta Pinheiro nunca deixou, de fato, de exercer.  Ao contrário de estereótipos que poderiam ser feitos em volta da figura de uma mulher da polícia civil, Rossana é tão sensível, gentil, educada e dedicada quanto uma esposa e mãe de dois filhos adolescentes – o que ela é. Também é tão segura, disciplinada e determinada quanto uma exemplar funcionária da polícia – o que ela também é.

Há apenas dois anos ela havia concluído a faculdade de Direito, quando assumiu, em 1997, aos 25 anos, o posto de delegada da Delegacia da Mulher de Natal, cargo que estava sendo ocupado até então pela Dr.ª Margareth Godim. Rossana não havia desenvolvido anteriormente um trabalho em defesa da mulher ou qualquer outra minoria e o espaço ocupado era recente, sem muito histórico ou expectativas. Era um desafio.


No Brasil, surgia a tentativa de adotar uma linha de polícia cidadã. Era uma nova visão de polícia.Almejava aproximar a segurança pública da população, que tantas vezes sentia-se vulnerável diante da violência constante e gradativa ao crescimento da capital. Nesse contexto, a delegada Rossana iniciou um trabalho de democratização do espaço social, no que dizia respeito, é claro, à delegacia da mulher. A vítima era ouvida e recebia o devido apoio. Contudo, fazia-se um trabalho de atenção também ao agressor, que outrora não era ouvido, mas banalmente pré-conceituado como “errado” e punido com a pena correspondente. “Como pessoa humana, agressor ou não, ele merecia receber atenção. Para que fosse punido, mas punido com justiça”, ela explica. A caracterização de sua linha de trabalho como delegada deu-se através dessa tentativa de imprimir uma forma de trabalho ética e mais justa de lidar com o ser humano.


Rossana conta que era difícil lidar com tantas situações de atentado à sociedade e a pessoa humana todos os dias durante seis anos – ela deixou o cargo de delegada em 2003 - sem que aquilo se tornasse comum. Contudo, acrescenta que só podia fazer um bom trabalho se cada caso fosse singular, uma vez que para cada vítima o seu caso era, de fato, ímpar, e cobrava toda a atenção possível dos responsáveis.


“Houve um momento que me serviu de alerta. Fui para um local de morte violenta e a cena era muito chocante. Era uma manhã. Fizemos todo o procedimento legal, chamamos a perícia, fizemos o que tínhamos de fazer profissionalmente ali e na volta, todos nós sentamos e almoçamos como se não tivéssemos visto nada. Então, eu pedi para todo mundo parar, porque eu mesma estava fazendo isso e disse: ‘Nós acabamos de ver algo tão trágico, que mudou toda uma vida de uma família e nós sentamos aqui e não falamos sobre isso. Nós sentamos para almoçar”, conta.


A dificuldade maior, segundo Rossana, é saber mesclar o profissionalismo e o sentimento na medida certa. Ela chama a atenção para a falta de suporte psicológico para profissionais da área, fazendo com que muitas vezes tivessem dificuldade de levar a vida pessoal paralela ao cotidiano do trabalho. “Trabalhar com o sofrimento humano traz sofrimento. O policial não tem um suporte psicológico para que possa enfrentar o dia-a-dia sem afetar a sua vida pessoal. É um esforço diário que cada um de nós precisa fazer”.


Um caso que tirou o sono da delegada foi o do chamado “maníaco da bicicleta” ou “maníaco do parque dos coqueiros”, responsável por, em média, quinze estupros denunciados e duas mortes de crianças na faixa etária entre nove e doze anos. A série de crimes aconteceu em 1999, quando a Delegacia da Mulher ainda era responsável pelos crimes praticados contra crianças e adolescentes.“Quando fomos verificar junto ao ITEP o corpo da última criança morta, nós que éramos profissionais e que tínhamos como obrigação estar acima de qualquer emoção, simplesmente nos abraçamos e choramos como crianças”.


Para lidar com toda a pressão psicológica, um pensamento era firme e constante em sua cabeça: “Eu sempre me colocava na posição de que eu tinha um objetivo a alcançar e que estava além de qualquer sentimento particular que eu pudesse nutrir, porque uma pessoa estava em situação de vulnerabilidade, sendo vitimada por um crime, precisando de uma providência legal e eu era a pessoa responsável por providenciar”, ela explica, com uma força na voz que contrastava com a emoção notória em sua expressão.


Em 2003, Rossana fora convidada pelo secretário de Segurança Pública a integrar uma equipe que estava sendo formada. Era um cargo que seguramente lhe traria benefícios. Contudo, a resposta foi concisa e decidida: nenhum cargo que já existia na secretaria a interessaria. O amor e a dedicação pelo que já fazia falaram mais alto. Mas havia, sim, um espaço que gostaria de ocupar. Espaço esse que, até então, não havia sido formado. “Ele achou um absurdo. ‘Ora, você não quer um cargo? Todo mundo quer um cargo’, ele perguntava”, conta, divertida. A explicação foi que trabalhava pelo prazer de fazer o que fazia e que não seria um cargo que mudaria aquela visão.


Então, o secretário, na época, Dr. Cláudio Santos, indagou-lhe o que gostaria de fazer. Prontamente, Rossana apresentou um projeto que já estava sendo idealizado por ela há algum tempo: tratava-se da Coordenadoria Estadual de Defesa dos Direitos das Mulheres e das Minorias. O projeto foi imediatamente apresentado à então governadora, Wilma de Faria, e logo em seguida colocado em prática, sob a coordenação de Rossana, momento em que deixou a Delegacia da Mulher.


Na coordenação do projeto que idealizara, Rossana implantou dois serviços já aprovados por lei, mas, até então,não colocados em prática: Disk Defesa Homossexual, grupo que, até então, detinha pouca visibilidade dentro da Segurança Pública, e SOS Mulher.


Contudo, logo se identificou um problema maior: a população não conhecia os seus direitos e os policias não detinham sensibilidade suficiente para trabalhar com as minorias. Criou-se, então, um programa educativo intitulado “Mulheres pela Vida”, formatado através de palestras destinadas a mulheres e policiais, a fim de conscientizar ambos os grupos, cada um com um foco diferente. O objetivo era conscientizar formadores de opiniões para que as idéias fossem passadas adiante. Ao todo, o programa atingiu diretamente 4.000 pessoas.


Ainda, na gestão de Rossana, foram criados programas como o Portas da Cidadania. Tratava-se da instalação de núcleos de apoio a mulher e ao idoso no interior do estado. Novas roupagens foram dadas ainda ao Disk Defesa Homossexual e SOS Mulher, de forma a não só receber as denúncias por telefone, mas facilitar o acesso geográfico das minorias aos órgãos de segurança pública, onde pudessem ser atendidos.


Em fevereiro desse ano, Rossana deixou a Coordenadoria Estadual de Defesa dos Direitos das Mulheres e das Minorias e assumiu o setor, também recente e idealizado por ela, de Planejamento e Projetos da Polícia Civil, sempre tentando abranger a defesa de mulheres e minorias. A delegada também é diretora no estado do Programa de Intercâmbio de Violência Doméstica entre o estado do Maine (EUA) e o Rio Grande do Norte.


Embora tenha passado por vários setores da segurança pública desde que, há quinze anos, ingressou da delegacia, Rossana tem a consciência de que os seus objetivos estavam além de ascensão política ou financeira. O trabalho fora o tempo todo o mesmo: defesa e melhoria na qualidade da segurança das minorias. A recompensa, segundo ela, não está em visibilidade social ou em cargos oferecidos, mas em cada sorriso singular que conforta todo o esforço de dias, semanas ou meses dedicadas a casos e projetos sociais. “A melhor parte e mais gratificante é receber o feed-back do meu trabalho. Encontrar um sorriso nos lábios das pessoas. E ver que a sua atuação teve um caráter transformador. Melhorou a vida de alguém. Às vezes, eu estou na rua e encontro alguém. A pessoa pergunta se pode me abraçar, porque eu mudei a vida dela. Isso, sim, é o maior presente que eu posso ganhar. Às vezes parece tão pequeno o que a gente faz, mas para aquela pessoa, foi tão importante”, conclui.

Fonte: Potiguar notícias
Em:  http://www.potiguarnoticias.com.br/internas.php?pd=noticias_visualizar&id=10755

6 comentários:

  1. Além de ser uma excelente matéria, também e uma Justa homenagem.
    Parabéns Doutora!

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  2. Muito Obrigada Dalrivan! Você como sempre muito gentil.Tenho tido muita sorte de encontrar em meu caminho pessoas como você. Um grande abraço.

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  3. Só agora vi que postou a matéria aqui, Rossana! Você (olha aí, to aprendendo ;P) com certeza foi uma das pessoas mais ricas em humanidade e vivência que tive o prazer de entrevistar.

    Um abraço! E sucesso sempre.

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  4. Obrigada Andressa! Me senti lisonjeada com a matéria. Ainda mais escrita por uma jovem brilhante como você. Muito obrigada mesmo! Desejo-lhe todo o sucesso do mundo!

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  5. A matéria resumiu, de forma brilhante, a bela figura humana que é a Dra. Roberta!!Abraços!!

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  6. Bom dia Rossana!
    Hoje pela manhã estive presente no seu café de boas vindas na DEAM de parnamirim e quero parabenizá-la por seu blog e por seu trabalho junto a Polícia Civil do RN em defesa da mulher potiguar.
    Desejo muito sucesso em Parnamirim e estou certa de que fará um excelente trabalho, pois competência tem de sobre para desenvolver.
    Que Deus a abençoe.

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